Sindiguardas - Subsede Zona Norte

Tribunal Regional do Trabalho declarou inconstitucional normas de aparência obrigatória nas Guardas Municipais





Tribunal Regional do Trabalho declarou inconstitucional e ilegal norma que proíbe guardas municipais de apresentarem-se ao público com barba, bigode, costeletas, cabelos ou quaisquer outros aspectos relativos à estética facial diversa de um padrão determinado pelo comando da Guarda Civil

O Estatuto Geral das Guardas Municipais (Lei 13.022 de 2014), em seu art. 2º, determina que as Guardas Municipais são instituições CIVIS, uniformizadas e armadas. No mesmo sentido, a respectiva lei no seu art. 14, parágrafo único, ordena que as guardas CIVIS não podem ficar sujeitas a regulamentos de natureza militar.
Pode-se afirmar que a exigência de corte de cabelo e barba militar, uso de boina, continência e outras tradições ligadas ao militarismo são vedadas pelo Estatuto Nacional das Guardas Municipais, uma vez que as Guardas são órgãos CIVIS para defesa social, igualmente são outras instituições de segurança pública, como por exemplo, a Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal, Polícias Civis e Polícias Penais.
Em conformidade com esses dispositivos legais, o Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região atendeu os pedidos do Ministério Público do Trabalho em Ação Civil Pública ajuizada em 2017 e todo o processo foi acompanhado e auxiliado pelo SINDIGUARDAS-CE, que participou das audiências por meio dos advogados Dr. Roberto Rebouças, Dr. Frank-Sinatra Dias Braga e Dr. Shaw-lee Braga, que buscaram, juntamente com o Ministério Público, conseguir arguir e convencer o magistrado da inconstitucionalidade e ilegalidade adesivada na lei municipal de Sobral que exigia barba e cabelos dos guardas municipais no estilo militar.
Os agentes de segurança municipais de Sobral sofriam ameaças de processo administrativo e assédio moral por parte dos comandantes caso não se apresentassem em serviço com cabelos curtos, barbas raspadas, sem bigode ou costeletas. Diante do constrangimento, o Ministério Público do Trabalho arguiu a inconstitucionalidade da lei municipal, solicitação acatada pelo Poder Judiciário.
No caso em apreço, é indubitável que a norma municipal invalidada violou por mais de uma década preceitos inerentes à intimidade, à personalidade, à vida privada, à dignidade da pessoa humana, operando ao arrepio do contido nos arts. 1º, III, e 5º, caput e inciso XLI, da CF/88, além da Convenção nº 111 da OIT. Como também não comprovada a razão de ser da discriminação estética vergastada, exsurge sobranceira a ilação de que a norma contida no Decreto 850, de 29 de maio de 2006, em seu art. 20, III, extrapola os limites de atuação do poder regulamentar municipal, em claro abuso de direito, pois excedeu os limites de sua finalidade, contrariando, portanto, a vedação do art. 187 do Código Civil e cometendo ato ilícito, passível de indenização.
Na decisão o magistrado determinou: I) a invalidade do inciso III do art. 20, do Decreto Municipal 850, de 29/05/2006; II) condenou a municipalidade a abster-se de restringir, impor regras ou sancionar de qualquer modo os guardas municipais por questões relativas à utilização de barbas, costeletas, bigodes, cabelos ou quaisquer outros aspectos relativos à estética facial, bem como divulgar por meio idôneo o inteiro teor desta decisão aos membros da Guarda Municipal, sob pena de multa arbitrada em R$ 10.000,00 por item descumprido; e III) condenou o município em obrigação de dar/pagar em título de danos morais coletivos o valor de R$ 50.000,00.
Partes citadas na Decisão
A administração municipal alegou no fundamento exposto em defesa que a norma era necessária e que, para haver engendrado a imposição estética ou padrão de aparência pessoal em comento, repousariam em: “restrições de cunho estético a medidas necessárias à garantia da segurança do trabalhador, sendo no caso dos profissionais de segurança pública, indispensáveis citadas medidas como forma de garantir-lhes maior integridade física, bem como propiciar à população, em um modo geral, o melhor reconhecimento destes agentes para coibir excessos em virtude da função”. Em suma, preservar-se-ia com a norma a incolumidade física do próprio trabalhador, além de facilitar a identificação dos agentes da guarda civil pela população em geral.
Analisando-se detidamente as funções desempenhadas pelo guarda civil de Sobral, entende-se como de difícil enquadramento as preocupações lançadas em defesa quanto a suposto risco à integridade física dos agentes, por apresentarem-se ao público com barba, costeletas ou cabelo diverso de um padrão. Talvez, diga-se de passagem, até porque não se aborda a tese em específico, tenha o poder executivo regulamentador abeberado-se de normas de disciplina atinentes às tropas militares e (...), o que de toda sorte não se aplica ao caso sub examinen.
Com relação à legítima inquietação do ente público de “propiciar à população, em um modo geral, o melhor reconhecimento destes agentes para coibir excessos em virtude da função”, também não se divisa em que medida a vedação ao uso de barba ou costeletas seriam determinantes para o mister colimado, máxime em se tratando de agentes públicos que trabalham fardados, e não raro com auxílio de viaturas caracterizadas.
Como se sabe nosso ordenamento jurídico propicia ao empregador a prerrogativa de dirigir o modo e a forma como se dá a prestação do serviço, no entanto, o direito potestativo não é absoluto, e encontra limite no princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III, CF/88).
O art. 5º, caput, da CF, por sua vez, garante a igualdade de todos perante a lei, ao passo que seu inciso XLI prevê textualmente que a “lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;”.

PARA SABER MAIS - HISTÓRICO DO CORTE MILITAR

Costeletas, bigodes, cabelo ou barbas sem padrão definido eram tendências nos exércitos até a 1ª Grande Guerra Mundial, no entanto, para evitar incômodos, e também porque dificultavam o uso de máscaras de gás, equipamento de sobrevivência fundamental para facilitar a respiração dos soldados que se deslocavam nas trincheiras, o corte de cabelo militar e barba raspada foi instituído por alguns exércitos com o objetivo de facilitar a respiração dos soldados com o uso de máscaras, reduzir o acúmulo de sujeira e, também, para evitar a propagação de pragas como piolhos, carrapato, pulgas e outros parasitas, pois barbas e cabelos longos eram um atrativo.
Foi durante a 1ª Grande Guerra que a utilização de armas químicas em forma de gás, como o gás de cloro, o gás mostarda e o gás fosgênio, ocasionou mudanças no campo de batalha e tornou necessária a utilização da máscara para filtrar o ar e garantir a respiração dos soldados. Com o uso da máscara, o ar deveria passar por um único acesso para ser filtrado antes de ser inspirado, no entanto, a barba longa dificultada o ajuste da máscara ao rosto, não permitindo que o material interno grudasse na pele e ficasse selado ao rosto para impedir a passagem do gás tóxico, comprometendo, portanto, o uso correto, não permitindo a aplicação do equipamento, que também não alcançava o funcionamento desejado porque o gás tóxico passava entre os pelos da barba e era inspirado pelos soldados..
O objetivo do corte de cabelo e barba militares foi instaurado também por questão de higiene, pois no campo de treinamento e de batalhas há escassez de água e os pelos faciais ficavam expostos a sujeira e aos gases tóxicos, e não havia água suficiente para a limpeza adequada, visto que quanto mais longos os pelos mais água seria necessária para a limpeza. Diante destas circunstâncias, alguns exércitos decidiram instituir um padrão de comprimento dos cabelos e barba raspada.
Em atmosfera de guerra o ambiente é enfermiço, inóspito, insalubre e para limpeza emergencial do corpo a água era escassa, e o pouco disponível nos bornais e cantis dos soldados providenciava rápida e fácil limpeza, assim sendo, quando o militar estava no campo de batalha, ou mesmo em treinamento, o pouco de água deveria ser aproveitada ao máximo para toda a tropa, e com o rosto sem pelos e cabelos curtos ou raspados seria fácil limpá-los das sujeiras. Outra dificuldade era, também, porque a barba e cabelos longos poderia enroscar-se nas armas e prejudicar a ação ou reação, comprometendo a vida dos soldados.
Nas Forças Armadas brasileiras, além do ideal de uniformização da tropa e da facilitação da limpeza em ambientes de risco, também foi muito difundido durante o Regime Militar que usar barba era sinônimo de comunista e de periculosidade, por isso, barba e cabelos longos foram desencorajados ou coibidos nas Forças Armadas.
Atualmente, as exceções para uso de barba pelos regimentos militares são poucas: é permitido para cobrir cicatrizes no rosto; para militares lotados em serviços de inteligência e, também, nos casos de dispensa médica, temporária ou definitiva, atestada por dermatologista da respectiva Força Armada.
A família Theophilo Gaspar de Oliveira tinha autorização do Exército Brasileiro para usar barba porque seus integrantes pertencerem a uma família, cuja linhagem de Generais, desde o período imperial, seus descendentes mantiveram a tradição de uso de barba para os membros da respectiva família, todavia, deveria ser barba de tamanho calculado, não podendo ser cavanhaque e nem barba exagerada, como antigamente se usava na época do presidente Marechal Deodoro da Fonseca e nos tempos do patrono do Exército, o Duque de Caxias.
A norma foi adotada no Brasil depois da proclamação da República (1889), no entanto, em vários países ainda é permitido uso de barba, como por exemplo nos países árabes, para proteger o rosto dos soldados contra o sol forte.
Em alguns exércitos essas regras estão sendo flexibilizadas. O exército dos EUA revisou a política de vestuário e aparência em memorando de 2017, e passou a permitir em serviço o uso de barba de até 5 cm, turbantes, véus, lenços e outras vestimentas que cubram a cabeça, como a hijabs, tranças e outros penteados, desde que o uso tenha motivos religiosos e não dificultem o uso de capacete e permita o uso de outros equipamentos de segurança e, também, não impeçam a camuflagem dos uniformes.
O motivo do corte de cabelo militar e barba raspada pelos policiais militares estaduais é devido suas instituições adotarem o padrão de vestimenta das forças armadas de defesa da Pátria, Exército, Marinha e Aeronáutica. Para os guardas CIVIS, o regramento não deveria ter muita utilidade, pois o uso de barba não modifica a capacidade do servidor para desempenhar com satisfação do público o melhor exercício das atribuições da sua profissão.








Post a Comment

Postagem Anterior Próxima Postagem